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O Telefone



    Vá ao balcão do bar e negocie uma ficha, dificilmente o dono cobrará pela ligação. Seja sincero sobre sua necessidade de conversar com alguém distante, mesmo que ele pareça desinteressado. Afinal, o telefone favorece sua liberdade e o dono precisa moderá-la.
    É estritamente proibida a entrega de mais de uma ficha por dia para um único indivíduo. Se você a receber agora ou depois, aproveite. Bebuns não te ouvirão à mesa, o dono do bar não saberá mais do que você pode contar em alguns minutos ou horas, desconhecidos não te darão atenção. Pois então, selecione mentalmente o melhor número que possa discar, imagine rapidamente como provavelmente acontecerá o diálogo, mas não planeje por mais de um minuto, apenas saiba como conduzir a conversa e, acima de tudo, não se esqueça de esticar o fio o máximo possível para longe da jukebox. Por perto os ouvidos estão afiados.
    O telefone começará a esquentar mais do que o normal após os primeiros oito minutos de conversa. Continue aguentando ou se despeça, sabendo que retornar aquele mesmo assunto e ouvir aquela mesma voz poderá demorar. As fichas são concorridas e haverá sempre alguém com um assunto mais importante que o seu. Portanto, esclareça os pontos finais e exclamativos, não deixe interrogações se não quiser sofrer de angústia.
  A função deste objeto de comunicação é aproximá-lo de quem ama puramente ou odeia amargamente, é romper qualquer barreira que te impeça de falar do que sente tanta vontade. Faça confissões, desabafos, declarações, aproveite o fato de que estará em um bar e poderá sempre culpar a bebida, aproveite a barulheira para fingir que não ouviu o que não quis escutar. Faça bom uso e não sinta mais nada que esteja acumulado, barganhe sua ficha.

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